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Textos e ilustrações
Fábio Souza
RESGATE TÉCNICO VERTICAL: USO DE MACA ENVELOPE
Operações de resgate e salvamento com vítimas em altura e espaços confinados envolvem exposição a um demasiado grupo de perigos. os riscos envolvidos nessas ações são gerenciados através de controle emocional, treinamento, preparo físico, equipamentos adequados e a aplicação de técnicas feitas por pessoas muito bem capacitadas. acidentes em cenários como barrancos, cavernas, montanhas, espaços confinados, plataformas elevadas de trabalho, silos, caixas d’ água, etc. envolvem ainda mais cuidados na retirada da vítima, ainda mais quando está presente algum trauma físico. Nesses momentos de resgate, o equipamento mais utilizado pelas equipes são sem dúvida as macas.
De acordo com a situação e disponibilidade, alguns modelos diferentes podem ser utilizados, sendo que as mais comuns são as do tipo envelope e do tipo cesto. Neste informe, traremos então informações para o uso adequado e seguro das macas do tipo envelope em operações de resgate e salvamento.
MATERIAIS CONSTRUTIVOS E CUIDADOS NECESSÁRIOS
A estrutura principal das maca envelope normalmente são compostos por uma placa laminada de polietileno com tratamento para exposição à radiação UV. A construção desse equipamento é feito de uma forma que propicie boa maleabilidade e que a mesma possa ser manipulada de forma a se moldar ao corpo da vítima.
Outra vantagem da maca envelope é que ela pode ser guardada enrolada para tomar pouco espaço no transporte. Importante lembrar que, por apresentar esta característica de manipulação constante (enrolar e desenrolar), deve-se levar em consideração que a placa de polietileno sofre estresse em algumas partes e assim a equipe de resgate deve constantemente inspecionar possíveis pontos de fragilidade após algum tempo de uso.
Ainda na parte construtiva, outro item importante são as fitas de içamento que normalmente são fabricadas de poliéster de alta tenacidade, um material bem resistente mas com pouca capacidade de absorção de impacto.
As inspeções e os cuidados com uma maca envelope devem considerar sempre o desgaste pelo uso, o contato com cantos abrasivos, trincas no laminado, cortes nas fitas, perda de continuidade nas costuras, contaminação por produtos químicos, exposição excessiva a raios UV e além disso o tempo de validade do equipamento que será determinado a partir da sua data de fabricação. As inspeções devem ser rigorosas, afinal uma vida será transportada dentro dela num momento de resgate.
Muitas vezes o desgaste feito pelo tempo não está nem associado ao uso excessivo, mas a forma como a maca é guardada. Algumas equipes de salvamento preferem deixar a maca pronta para o uso e acondicionadas em cima de viaturas de emergência. Dessa forma o equipamento fica exposto muitas vezes ao sol e intempéries sem necessidade. Outros tipos preocupantes de guarda: em local pouco ventilado, com umidade, próximo de produtos químicos, armazenamento dentro da bolsa após o uso sem que o material seque, etc. Esse tipo de conduta fatalmente reduzirá o tempo de vida útil do equipamento.
BENEFÍCIOS DA MACA ENVELOPE
As principais vantagens de aplicação desse equipamento no resgate estão na redução de peso e volume no transporte, facilidade de montagem e a forma como se molda ao corpo da vítima. Essa última inclusive facilita muito resgates onde a vítima precisa passar em locais estreitos e ou apertados, como em espaços confinados, fendas de cavernas e montanhas. Outra situação positiva está associado ao seu corpo liso e sem muitas interferências na parte externa inferior que facilita o resgate com técnicas de arraste em barrancos e locais remotos.
PONTOS NEGATIVOS
Em relação às macas cesto, uma das desvantagens é o tempo de validade do material construtivo, pois o polietileno degrada mais rápido do que os metais empregados na construção da cesto.
Devido à maleabilidade do material, algumas macas envelopes podem sofrer algumas torções e dobras em algumas técnicas de içamento e movimentação que podem resultar em prejuízos na segurança e estabilização da vítima. Ainda tratando de estabilização, um outro ponto negativo da maca envelope é que elas, na grande maioria, necessitam previamente de uma prancha rígida longa para uma vítima de suspeita de trauma na coluna.
Sendo assim a equipe deverá pensar em portar os dois tipos de dispositivos para atuação, ou um CINTO IMMO que pode suprir parte dessa necessidade.
CUIDADOS NA MONTAGEM
O uso de macas em resgate requer sempre muito treinamento e conhecimento por parte dos membros da equipe. Uma das grandes falhas que ocorrem na operação com esse equipamento, é a perda de equilíbrio e do controle durante a movimentação.
O equilíbrio de uma maca, seja em movimentação vertical, diagonal ou horizontal, é peça chave para um resgate bem feito, com conforto e segurança para a vítima. O equilíbrio da maca está diretamente relacionado ao posicionamento correto da vítima, distribuição da massa corporal e a colocação das fitas de içamento de forma correta. Muitas macas possuem fitas de cores e tamanhos diferentes para evitar esse tipo de falha, principalmente em içamentos com a maca na horizontal. Uma montagem errada pode fazer com que a vítima fique com a cabeça tombada para baixo e essa situação pode ser muito perigosa e nada confortável para quem está sendo içado.
Fundamental lembrar que o estado clínico da vítima deve ser muito bem avaliado antes de posicioná-la na maca, ainda mais em manobras demoradas. A maior parte do casos de movimentação ocorre com a vítima na posição horizontal, com a cabeça levemente elevada.
Nas questões relacionadas com a montagem da maca, outra parte importante no equilíbrio está associada ao uso de placas de ancoragem. A posição da placa em relação à entrada das fitas e das cordas pode fazer com que a maca fique torcendo e realizando movimentos desnecessários. A posição da placa em relação à linha da maca pode mudar muito a movimentação de giro.
O equilíbrio de uma maca pode envolver também a aplicação de técnicas dinâmicas como o famoso STEF (Sistema Técnico de Equilíbrio Fácil) onde o posicionamento pode ser alterado da horizontal para a vertical de acordo com a necessidade.
A montagem pode ainda envolver duas cordas, uma corda, duas cordas + um backup na vítima, sistemas de içamento cruzado com 4 cordas, uso em cordas tensionadas, etc.
A equipe de salvamento deve entender muito bem o cenário, estar bem treinada e aplicar as melhores técnicas de acordo com cada situação.
Algumas situações de manobras, principalmente com suspensão prolongada e muita movimentação, podem requerer o uso de destorcedor entre as cordas de içamento e a maca.
Essa montagem se faz necessária para evitar ou minimizar a possibilidade de giro sem controle do equipamento. Em manobras de resgate com uso de helicópteros, por exemplo, são muito comuns o uso desse tipo de montagem, assim como também içamento utilizando bloco de polias em 4:1 onde o giro pode fazer com que as cordas se enrosquem e prejudiquem a finalização da manobra.
A experiência dos resgatistas, disponibilidade de equipamento, agilidade necessária e os protocolos da equipe são os fatores que determinarão o tipo de montagem a ser empregada.
O que nunca pode ser esquecido é que a manobra deve ser segura sempre e a vítima deve ser preservada ao máximo quanto a sua
estabilidade e situação clínica, buscando seu máximo conforto durante toda a movimentação.
APLICAÇÃO DE TÉCNICAS
o uso de uma maca envelope permite a aplicação de variados tipos de técnicas. as mesmas técnicas que seriam utilizadas na movimentação de uma vítima diretamente em um cinturão podem ser aplicadas com a vítima na maca e com a vantagem de deixar a mesma em uma posição mais confortável e segura.
Transporte manual
Mais seguro do que transportar com uma prancha rígida, é transportar a vítima com uso de uma maca envelope.
As alças laterais da maca propiciam melhor pegada para o resgatista e além disso a vítima fica mais protegida contra batida em alguma estrutura durante movimentação ou do risco de ficar com os braços ou pernas caindo o para o lado de fora da prancha rígida. Vítimas de trauma cervical normalmente deverão antes serem estabilizadas em pranchas rígidas de acordo com protocolos médicos.
Transporte por arraste
Em situações onde o piso traz riscos para a movimentação dos resgatistas, quando não é possível fazer içamentos ou quando a equipe é reduzida, a maca envelope pode ser usada para transporte por arraste.
Passagem por bocas de visitas
A dificuldade de tirar alguém de dentro de um espaço confinado pode ser vencida de uma melhor forma quando a vítima é literalmente “envelopada” pela maca fazendo com que o volume do seu corpo seja reduzido e assim consiga vencer obstáculos no caminho de sua movimentação até um ponto seguro.
Içamento/ descida vertical
De acordo com o estado clínico da vítima e o cenário do resgate, a maca envelope permite o içamento com o equipamento totalmente na vertical. Nesse tipo de manobra, a estabilização dentro da maca deve ser muito cuidadosa a fim de não existir o risco da vítima escapar. Numa situação assim é muito importante montar um back up de corda diretamente na vítima.
Nos içamentos ou descidas, a posição mais segura e confortável para a vítima é aquela onde a maca permanece na horizontal com a cabeça elevada em relação ao resto do corpo, mas nem todos os cenários permitem que e a manobra seja feita assim. Trabalhar com a maca na horizontal ou na diagonal deve estar sempre em primeiro lugar no planejamento do resgate.
A estabilidade da maca se torna mais fácil e a vítima ficará numa posição bem mais confortável.
Movimentação por tirolesa
Outra técnica muito aplicada para movimentar uma vítima com maca é a montagem de cordas tensionadas ou tirolesas. Os movimentos podem acontecer na horizontal, em diagonal e também com mudança de direção para vertical (kootenay). Independente do tipo de montagem e do obstáculo a ser vencido, os princípios de segurança são sempre os mesmos. Em descidas por cordas tensionadas é válido atentar ao risco de quebra da estrutura de uma maca e portanto a tensão não deve estar apenas no corpo plástico do equipamento. Montar a corda de tração/retenção ligada a uma polia e ou a uma placa de ancoragem é uma prática muito mais segura.
Aplicação da corda do vento ou corda guia
Em muitas situações, durante o movimento de descida ou subida, a maca precisa ser afastada de alguma estrutura ou de alguma situação de risco. Para isso é necessário que a maca receba, em sua alças laterais, a instalação de uma terceira corda (pelo menos) para que exista uma tração e a vítima seja afastada para longe de uma situação de risco. A montagem da corda do vento/ guia deve levar em consideração o esforço que será feito para puxar a maca, o ângulo que será formado e por quanto tempo a maca deverá se afastar. Esses itens devem ser analisados para determinar como a corda do vento será montada. Algumas equipes preferem segurar a corda do vento somente com as mãos, enquanto outros cenários necessitam que a corda seja realmente montada em algum ponto de ancoragem seguro e com uso de algum dispositivo (descensor, por exemplo) para criar atrito e controle dos movimentos. Ainda nesse tema é importante que o resgatista saiba exatamente onde poderá fixar a corda do vento na maca. As alças de apoio manual, por exemplo, podem não suportar a aplicação de muita força e se romperem. Necessário consultar o manual e ou o fabricante para entender os limites do equipamento.
STEF
O uso dessa técnica na montagem de uma maca envelope deve ser bem calculado para que o objetivo seja atendido. Alguns problemas que podem ocorrer na hora de executar a manobra estão relacionados com a distância entre as fitas de içamento e o tamanho das mesmas onde a maca pode não ficar totalmente verticalizada no momento de retirar a tensão do STEF. O sistema pode não possuir amplitude suficiente para deixá-la na posição desejada. Antes de usar esse tipo de técnica, conheça bem os limites do equipamento que irá utilizar e calcule os espaços necessários para chegar na posição desejada.
o uso de macas em resgate são sempre muito técnicos e obviamente despertam um grande interesse nas equipes de resgate. essa ferramenta é muito importante para as pessoas que atuam em operações reais de salvamento e também para os centros de treinamento que constantemente desenvolvem diferentes aplicações das macas envelope em resgates verticais e em espaços confinados.
O treinamento constante é uma das chaves para o sucesso em operações reais. Conhecer diferentes técnicas, diferentes aplicações, maneiras de montagem e também de operação devem fazer parte do programa de treinamentos.
O resgatista deve entender onde as falhas podem acontecer e como resolvê-las se isso acontecer. Obtenha conhecimento sobre diferentes modelos de macas e mais ainda sobre a maca que a sua equipe costuma utilizar.
Saiba mais em:
Fábio Souza é Técnico em Segurança do Trabalho, professor em cursos de formação de SST, graduado em Gestão Ambiental, pós-graduado em Psicopedagogia Institucional e em Gestão de Emergências e Desastres, é escritor e Supervisor de Acesso por Cordas N3 e Coordenador de Resgate Industrial na empresa Controle Acima. Utiliza os equipamentos Ultra Safe em seus projetos e treinamentos e é parceiro técnico da CORAX, empresa detentora da marca Ultra Safe.